sexta-feira, 22 de março de 2024

MORDOMIA | Merrill D. Moore

A mordomia é princípio espiritual e ensinamento bíblico. Reconhece Deus como dono de todas as coisas; o homem é responsável pelo uso dessas coisas conforme o propósito de Deus; o homem tem de prestar contas da qualidade e dos resultados de seu gerenciamento. O princípio é importante para a ética cristã, além de suas aplicações conhecidas, como a generosidade em relação ao dinheiro e o cuidado das finanças da igreja.

As palavras mordomo e mordomia, no NT, significam “administração da casa”. Ao mordomo – um servo fiel em quem havia confiança - era confiada autoridade para administrar a casa e os afazeres empresariais de outra pessoa. A aplicação do NT inclui a mordomia do evangelho e do ofício do ministério (1Co 4.1; Tt 1.7; 1Pe 4.10). A mordomia envolve responsabilidade quanto a tudo que nos é confiado. Engloba toda a vida.

A mordomia é baseada no fato de que Deus é criador de todas as coisas e retém a soberania sobre tudo. A fé cristã afirma que a criação de Deus é “boa”, conforme o próprio Deus declarou seis vezes na história da criação em Gênesis 1 (vv. 4, 10, 12, 18, 21, 25, 31); as coisas criadas são boas em si mesmas e em relação aos propósitos de Deus; sua qualificação de bem ou mal pode ser determinada pela forma como são utilizadas. Isso contrasta, fortemente, com outros conceitos do mundo material, como, por exemplo, o gnóstico (a matéria é, essencialmente, má); maniqueísta (as “trevas” estão em constante luta contra a “luz”); hindu (a matéria é uma ilusão sem valor); budista e suas derivações populares atuais (material sem valor, nociva porque contribui para o desejo, e tem de ser rejeitado mediante práticas de ascetismo); e marxistas socialistas (o valor absoluto e último reside na matéria).

O propósito revelado de Deus, a redenção da humanidade por meio de Jesus Cristo, envolve o testemunho de pessoas redimidas e o uso das coisas criadas nesse testemunho. Deus entregou suas coisas criadas ao homem, para serem administradas e utilizadas conforme esse propósito, seu próprio sustento, seu desenvolvimento espiritual, o bem-estar da humanidade, a entrega da mensagem da redenção a toda a humanidade, e a glória de Deus. Como mordomo responsável, o homem será julgado pelo uso de tudo que lhe foi confiado (Lc 12.42; 16.2 e seguintes; 1Co 4.2).

A aplicação histórica e mais bem conhecida do princípio se refere aos dons. O AT contém requerimentos detalhados sobre os dízimos que seriam trazidos pelo adorador (por exemplo, Lv 27.30–32; Ml 3.8–10). O NT não prende o cristão à exterioridade da lei mosaica, mas à interiorização da lei mais nova e mais alta do amor, que exige mais, e não menos, do crente redimido (Mt 5–7, esp., 5.17, 21, 27, 33, 38, 43, 48; 23.23; Jo 14.15; Rm 6.15; 13.14; 2 Co 5.14). A mordomia, conforme vista no dar, é apenas uma faceta da totalidade da doutrina a qual inclui muito mais. Mas isso não dilui sua aplicação nem enfraquece seu significado ou justifica a negligência.

Entendido corretamente, o princípio de mordomia se aplica à totalidade da vida, a todos os atos e atitudes; à personalidade e à influência pessoal; às questões financeiras, aquisição e uso, aos gastos, economia, investimentos, doações e disposição final do dinheiro; ao uso da terra, recursos e ferramentas, profissão, emprego ou lugar de serviço; ao estudo da pessoa e o uso que faz de sua educação; ao culto a Deus, testemunho de vida cristã, propósito e alvos de vida.

A mordomia, continuamente, fala aos problemas atuais em cada era e em cada área da vida. Comparada com o propósito de Deus para sua criação, qual a relação de um mordomo com outra pessoa criada à imagem de Deus, qualquer que seja sua posição, seu lugar, sua raça? O que dizer da exploração de pessoas? Qual a responsabilidade do cristão quanto à terra, seus recursos naturais, sua ecologia? Qual é a parte do cristão na transformação social? Qual sua relação com os centros de poder? O que dizer sobre o uso e a disposição de seu dinheiro? E quanto à mordomia da própria igreja? O que dizer sobre seu orçamento e a divisão dos fundos para si mesma e para os outros? O que dizer das igrejas que pagam mais juros nas dívidas de construção do que contribuem para toda a atividade missionária fora do seu território?

Em termos simples, a mordomia nos impele a perguntar: qual o propósito de Deus para mim, nas minhas relações interpessoais, no meu uso de recursos, em minha atitude para com o universo criado e no uso que faço dessa criação?

MERRILL D. MOORE

Merrill D. Moore, “Mordomia”, trans. Elizabeth Gomes, Dicionário de Ética Cristã (São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2007), 406–407.

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